11 de abril de 2005

Cien años de soledad

«Macondo já era um pavoroso remoinho de pó e escombros, centrifugado pela cólera do furacão bíblico, quando Aureliano saltou onze páginas para não perder tempo com factos demasiado conhecidos, e começou a decifrar o instante que estava a viver, decifrando-o à medida que o vivia, profetizando-se a si próprio no acto de decifrar a última página dos pergaminhos [profetizados um século antes por Melquíades], como se estivesse a ver-se num espelho falado.

Então deu outro salto para se antecipar às predições e ver a data e as circunstâncias da sua morte. No entanto, antes de chegar ao verso final, já tinha percebido que não sairia nunca desse quarto, pois estava previsto que a cidade dos espelhos (ou das miragens) seria arrasada pelo vento e desterrada da memória dos homens no momento em que Aureliano Babilónia acabasse de decifrar os pergaminhos, e que tudo o que neles estava escrito era irrepetível desde sempre e para sempre, porque as estirpes condenadas a cem anos de solidão não tinham uma segunda oportunidade sobre a Terra
».

in, Marquez, Gabriel Garcia (1967/2003), Cem Anos de Solidão, Lisboa, Dom Quixote, pp. 327-328.

Sem comentários: