16 de novembro de 2008

A mania de complicar

O Estado-Providência tem normalmente três dimensões: políticas sociais, concertação social e regulação económica.

Nunca essas três dimensões coincidiram em simultâneo em Portugal. Na sequência desta crise financeira, há a promessa da terceira dimensão entrar na agenda política. De corpo estranho, o regresso do político ao mercado, surge agora como corpo messiânico. Mas só enquanto o sistema financeiro tiver fome dos recursos públicos, bem entendido. Mesmo de saída, o tonto [ainda] presidente dos EUA conseguiu garantir um fraco entendimento na cimeira dos G20 (decorreu este fim-de-semana em Washington) que, basicamente, deixa tudo na mesma. O mercado continuará intocável.

Com políticas sociais deficientes, mal integradas e frequentemente mal avaliadas, a Portugal já nem sequer resta a concertação social. O autismo do governo com respeito à educação é um exemplo de fraco entendimento democrático. Porque, ainda que os sindicatos dos professores possam ter subvertido a ideia de concertação social ao não honrarem os seus compromissos, sobra a realidade de, com ou sem interlocutores, a esmagadora maioria dos professores não quererem ser avaliados e muito menos segundo um modelo que os transforma em meros funcionários.

Antes de mais, o governo deveria ter-se assegurado se existiam condições socialmente não fracturantes para avançar com esta avaliação aos professores. E só depois negociar. A maioria absoluta terá levado os socialistas a caminhar precisamente ao contrário. Essa abordagem resultou bem nos governos da União Nacional mas actualmente não são muito populares.

E este governo não compreendeu bem qual a sua missão. Os interesses dos alunos não estão a ser salvaguardados e, ainda que os professores tivessem assimilado muito bem este modelo de avaliação próprio de um regime paternalista (a desconfiança que os professores suscitam no governo é evidente e esse é um péssimo ponto de partida), a qualidade do ensino continuaria a decrescer. Porque ao reduzir a educação a uma gestão racional económica, o governo reconhece que não está muito interessado em educar com qualidade. Isso está bem presente na obsessão com as novas oportunidades, no facilitismo ilusório com que uma criança progride actualmente até ao 9º ano de escolaridade, e na transformação das instituições geradoras e transmissoras de conhecimento - as universidades - em empresas privadas.

Independentemente de ser exigível uma gestão racional dos recursos públicos, a educação e a saúde não têm que dar lucro imediato. O seu «lucro» para a sociedade consiste em assegurar que os seus membros são cidadãos exemplares, empreendedores, qualificados profissionalmente e saudáveis para poderem assumir os seus compromissos e retribuir o investimento feito.

É possível que alguns membros do governo sejam suficientemente esclarecidos mas o que se observa é uma incompreensível tendência para complicar a simplicidade.



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