As presidenciais americanas entraram agora na fase da histeria colectiva, em que as duas barricadas matam ou morrem. Há muito que as questões essenciais deixaram de ser debatidas. Dos resultados, que as incontáveis sondagens teimam em prognosticar bastante apertadinhos, corre-se o risco de ver entrar metade dos americanos em profunda depressão. É compreensível e até podemos comparar com o que se vive em Portugal quando o clube do coração não ganha.
Acontece que, no caso de Bush vencer (mais ou menos fraudulentamente e apoiado pela metade necessariamente acéfala do país), a depressão transbordará para o resto do mundo. Depressão e chumbada para quem se portar mal...
Mas, à margem de histerias colectivas e depressões, não podia deixar passar em claro um zum-zum que me chegou aos sentidos, nem de o partilhar contigo. Nos comicios em que o candidato Bush tenta roubar a inocência a indecisos (em estados como a florida ou a pensilvânia, por exemplo), a sua chegada é precedida de um vôo rasante com o mítico air force one sobre o local, qual messias que se prepara para abençoar aquela gente. A aterragem é transmitida em directo para o local do comício enquanto milhares de pessoas agitam nervosamente bandeirinhas na expectativa de que com ele, desça do avião o Papa.
Mas, a homilia não termina aqui porque o messias dirige-se para o seu santuário e aí, um sacerdote encarrega-se de solicitar protecção divina para todos e para o presidente, rezando todos em conjunto.
É assim que sucede na grande e experiente democracia: um candidato utiliza os recursos que tem à mão para se auto-promover. Além disso, Deus está do seu lado porque propõe combater os infieis e além disso, combater os infiéis (muçulmanos, homossexuais, negros, etc.). A carneirada aprova e diverte-se enquanto engole uns quantos Big Mac. Por menos a nossa Edite Estrela levou logo com o «talha bestas», embora a manobra tenha sido mera publicidade. Mas pelo menos serviu de referência pedagógica para o que não deve ser feito. E se Kerry se lembrasse de pedir emprestado o air force one para fazer uns loops? Ah, mas não podemos esquecer que Deus e Bush são unha e carne. Só isso poderá explicar porque razão não se encarregou a própria natureza de desfazer equívocos à nascença.
Estado, religião, justiça e dinheiros públicos não são afinal competências indissociáveis? No pequeno mundo de Bush, sim. Esta perspectiva é aterradora se a considerarmos presente nas convicções de 150 milhões de pessoas do Império que nos regula e orienta as vidas. Pouco falta para ser ele o juíz, contabilista, presidente e padre de um país em generalizado estado zombie.
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