17 de junho de 2005

Afinal quem é o Estado?




Apesar do Estado português não controlar mais do que 15% do capital da EDP, não deixa de ser interessante registar como as inquietações orçamentais são mesmo e somente assunto do Estado, e portanto, completamente afastadas do âmbito de preocupações dos accionistas privados.

A EDP é uma empresa consolidada e sem concorrentes naturais no território português, gere confortavelmente o monopólio da electricidade. Até aqui tudo bem. Ou não…

Senão vejamos. A fotografia acima (e a que está abaixo), referem-se às boas práticas de comunicação com os clientes que esta empresa tem vindo a desenvolver, assim como muitas outras com resultados extremamente positivos ano após ano. São os incentivos fiscais, são os regimes especiais de contribuição, é a própria legislação que condiciona numa malha muito fina, a emergência de operadores privados concorrentes.

Assim, é crucial compreender que este sucesso se deve em grande medida ao papel do Estado. Que, refira-se, não é ELES (apesar de ser um deles) e dizem-nos que afinal, o Estado somos todos NÓS. Confesso que esta contradição me causa natural prurido.

Sem mais delongas, vamos «directo al grano». Estes 3 cadernos finamente envolvidos por uma capa do mais exótico material plástico, fazem parte, como dissemos, da estratégia de comunicação da EDP, no caso em particular, constituem o Relatório e Contas 2004. São eles, o Caderno de Sustentabilidade, Caderno Financeiro e Caderno Institucional e do Governo da Sociedade.

Cada um tem aproximadamente 130 páginas, ilustradas, com uma tiragem de 2500 exemplares. São 7500 exemplares.

Não querendo ser mais papista que o Papa nem mesquinho, ao ponto de acusar a EDP alegando que se trata de um desperdício injustificável em tempo de vacas magras, não deixará de ser pertinente colocar a seguinte questão.

Quem é afinal o Estado?

Bem sei que isto é uma gota no oceano mas quer-me parecer que por uma questão de princípio e coerência com aquilo que é frequentemente ouvido pelos responsáveis dos grandes grupos nacionais em ataques cerrados ao Estado, seria mais sensato encontrar uma alternativa e não pôr o pé em falso em épocas de grande fragilidade, não só económica como também, social.

Esses 7500 exemplares (caso não tenha sido um best-seller, que tenha obrigado à sua reedição) foram distribuídos pelos principais accionistas e pelos principais clientes. Entre os quais as 308 Câmaras Municipais, Ministérios, etc.

Duvido que entre todos estes clientes, haja um que não tenha acesso à Internet, onde esta informação pode e deve ser publicada. E de facto, está lá. Clicar aqui. E se houverem 20 pessoas que leram os três cadernos, não me resta outra coisa senão aplaudir. Mas entendo que ficam muito bem em qualquer prateleira.

Esta pequena brincadeira que custou uns milhares de contos, multiplicada por outras na mesma empresa e acrescidas a tantas outras em empresas comparticipadas pelo Estado, representa no final, provavelmente, o equivalente ao salário de uma quantidade considerável de pessoas que estão no desemprego sem nada produzir, a não ser depressões; ou o equivalente à diminuição de preços por escalões de consumo, por exemplo, em lares com fracos recursos económicos.

Não são as empresas que vão resolver as contas públicas, mas sem dúvida que lhes cabe a responsabilidade moral de não assobiar para o lado. E nesses termos, o que mais preocupa é a inexistência de um sinal claro que comprometa TODOS, em iguais proporções, em torno de um mesmo objectivo.

Nesse caso, sim, também as empresas podem e devem inequivocamente ajudar a pagar o défice das contas públicas.

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