1 de junho de 2006

The Chosen One Is Able to Read

O entusiasta pela causa comunista que não abdica de um nobel avo, do status quo ou do seu Lanzarote way of life; que por acaso também é escritor e por sinal, mundialmente lido; e que também por acaso integra as listas de um partido político apelando simultaneamente aos cidadãos que assumam uma conduta abstencionista, integra ainda e novamente por acaso, a Comissão de Honra do Plano Nacional de Leitura promovido pelo governo. Uma honra… tanto cargo, tanta toleima. É possível que estas duas variáveis se comportem positivamente numa correlação estatística.

Uma vez mais, apesar de integrar tal comissão, esta criatura questiona a validade do plano no seu estilo decrepitamente irreverente, mantendo a total incoerência que o caracteriza. Ele e Soares estão a fazer escola, de resto… Na verdade, o homem é de tal forma coerentemente incoerente que desafia a racionalidade do vulgo com tamanho acerto desacertado. Desta vez, não só questiona algo que apadrinha, como sustenta o carácter elitista e intemporal da leitura («ler sempre foi e sempre será coisa de uma minoria»), ignorando os milhões que lhe entraram no bolso, resultantes da venda de outros tantos livros. Ler é portanto, uma faculdade que só aos predestinados diz respeito. É a puta da lei em desconcertante acção.

Para José Saramago, «voluntarismos» destes levam a nenhures porque «ninguém precisa de estímulos para se entusiasmar com o futebol». Após defecar esta sentença, lá vai justificando a paixão pelo futebol com a existência de uma «operação de propaganda fabulosa». É exímia esta capacidade flic-flac[queante] do escritor, observando como tolice no Plano Nacional de Leitura, aquilo que considera fabuloso no sucesso promocional de outra actividade lúdica. O reconhecido autor revela assim o relativismo Absoluto do seu raciocínio, em toda a impensada e confusa dimensão. Oportuno, Saramago dá um tiro no pé e consegue que na mesma sequência o membro atingido se precipite com denodada violência sobre o seu próprio nariz. Arriscadamente circense.

2 comentários:

Anónimo disse...

É necessário fazer aqui uma pequena correcção, A leitura já não é assim tanto coisa de uma minoria, a leitura de boa literatura é que o é e será sempre. E isto por um motivo muito simples: a leitura é um acto individual, radica na escolha de cada indivíduo. Resultante dessa escolha, sabe-se que apenas uma minoria lê bons livros, bons escritores e etc. Portanto, e na medida que temos uma boa rede de bibliotecas, o argumento do elitismo em relação ao acesso já n faz escola. A não ser que se fizesse uma revolução cultural e se for por aí não estou muito de acordo, pois agrada-me a ideia de ter livros com capas de várias cores, azuis, brancas, verdes, roxas, cinzentas, pretas. A verdade é que o monopólio do vermelho acabaria por tornar a realidade triste e sensaborona.

ARV disse...

E quem define o bom e o mau livro? Não será uma escolha que cabe a cada um, individualmente? Para muitos em Portugal, o Paulo Coelho é boa leitura... Para poucos, na China, também... Ou seja, na China, se calhar o Paulo Coelho é lido por «elites».

Vão haver sempre minorias, mas como dizes, referem-se ao juízo subjectivo que norteia as escolhas de cada um. Actualmente, a paleta de escritores e obras é tão variada que há espaços para todo o tipo de gosto. Não estamos propriamente a viver o Séc. XIV, durante o qual a leitura era reservada aos monges e a um ou outro nobre. Ler era realmente uma actividade reservada a uma minoria, uma actividade isolada.

No limite, tens o caso do jornal A Bola, lido por imensa gente. Para esses, é a melhor literatura que pode haver e dispensam outra.

Como sabes, tenho alguma dificuldade em concordar com o Saramago, justamente porque trata uma coisa que deve ser banalizada com uma atitude reaccionária, própria de quem se arroga o estatuto privilegiado de algo. Na expressão popular «uma prega a mais no cú do que os outros».
Da mesma forma, tenho dificuldade de digerir o tema da «alta» e da «baixa» cultura, mas talvez seja a influência etnológica.

Um abraço