5 de outubro de 2007

O sistema educativo nos 97 anos da República

Nas comemorações do nonagésimo sétimo aniversário da implantação da República, Cavaco Silva centrou o seu discurso na educação e numa nova abordagem sobre a mesma, que a enquadre definitivamente na realidade e necessidades do país. Como o exigem as circunstâncias e o protocolo, Cavaco Silva leu um texto conciliador, sensato e de alento às tropas.

Do longo discurso, destacam-se duas ideias que, sem serem inovadoras, não foram escamoteadas como habitualmente. A primeira resulta da observação à acção das escolas ao longo dos últimos noventa e oito anos, a qual jamais conseguiu passar o patamar do sofrível. A segunda ideia resume-se pelas próprias palavras do Presidente da República, segundo o qual, «a educação em Portugal foi sempre tratada como um problema de governo e não de regime». Esta afirmação é uma farpa que assenta inteirinha e se acomoda no lombo dos que nos governam e dos que se lhes opõem.

O discurso foi bonito, de estadista, mobilizador e quase de ir às lágrimas. Digno de consensos alargados.

Porém, o que fazer com uma política educativa assente no pilar do saneamento financeiro sem outras contrapartidas? O que fazer com o excesso de professores irresponsavelmente formados pela também irresponsável gestão da autonomia universitária pelas universidades? O que fazer com a injusta e desmotivante condição de saltimbancos de Estado a que são votados os professores? O que fazer com a indignidade que caiu sobre o corpo docente, manietado por alunos, colegas, pais? O que fazer com os milhares de maus profissionais saídos das universidades, cujas aptidões foram analisadas à luz das receitas que cada cabeça de gado proporciona às instituições de ensino superior? O que fazer com a alarmante ocupação de postos de trabalho no ensino superior por indivíduos incompetentes na profissão mas competentes na amizade? O que fazer com alunos provenientes de famílias com fracos recursos financeiros, de famílias desestruturadas, de bairros problemáticos, cuja única motivação em ir à escola é a ditadura da escolaridade obrigatória e, em muitos casos, o lanche? O que fazer com um sistema de ensino que está organizado para as estatísticas a enviar para a União Europeia e não voltado para as reais necessidades académicas e profissionais do país? O que fazer com pais incompetentes, irresponsáveis e eminentemente irracionais? O que fazer com pais ausentes, obstinados com as suas carreirinhas profissionais ou domesticados pela opressão fomentada por patrões gananciosos? O que fazer com um país incapaz de compreender que não podem haver qualificações de primeira e qualificações de segunda? O que fazer com a classe de políticos que temos? O que fazer com o futuro do país, onde as reformas do sistema educativo se sucedem de tal forma que podem ser associadas ao nome do ministro que assinou o documento?

O que fazer com as crianças, frequentemente as últimas a serem ouvidas em qualquer processo, mesmo que seja o seu?

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