6 de fevereiro de 2008

Violência Doméstica e SNS

A violência doméstica é um tormento social. Alguém no parlamento, lembrou-se nos idos de Maio do ano passado, que sim, que existe e que deve ser mitigado. Talvez por essa razão, foi promulgado um decreto-lei que isenta as vítimas de violência doméstica do pagamento de taxa moderadora nos hospitais. Mas nem sempre isso acontece. Talvez também porque nos hospitais de hoje, a orientação qualitativa foi claramente objecto de colonização pela orientação quantitativa.

No hospital de S. Marcos (Braga), uma mulher alegadamente vítima de violência doméstica foi tratada no hospital e intimada a pagar uma factura de 152 euros porque o Serviço Nacional de Saúde (SNS) não comparticipa consultas motivadas por agressões. Para reaver o montante, a senhora tem que obter a acusação do agressor (marido) em tribunal pois, para o Hospital de S. Marcos, essa é a prova de facto, que a senhora foi agredida pelo marido e não por outra pessoa qualquer.

A violência doméstica é um assunto tabu, ainda muito dominado pelo adágio «entre marido e mulher não se mete a colher». Lá no escaninho do lar, eles é que saberão das suas façanhas, esgrimirão os seus argumentos e assumirão as respectivas culpas. Talvez uma vez mais, por isso, só uma ínfima parte das agressões é objecto de denúncia na polícia e, dessas, uma «nanoparte» dos casos vai a tribunal. Desse ponto de vista, até se poderia admitir que a obrigatoriedade de provar a agressão se integrasse numa estratégia latente que vise convidar estas vítimas a levar os seus casos a tribunal.

Porém, mesmo desse ponto de vista, o Estado poderá não estar a assegurar os interesses imediatos do agredido, na cegueira de chegar ao agressor.

Para além disso, restam todos os outros tipos de agressão: independentemente das circunstâncias que motivaram a agressão, a regra consiste em o agredido pagar a consulta e a taxa moderadora hospitalar, resultantes dos danos causados pelo agressor (que até podem ter sido os escrupulosos agentes da autoridade).

Mas para que as não pague, como foi dito, tem que provar que foi vítima de uma agressão, na convicção de que o sistema judicial português, apesar de preguiçoso, age de acordo com os princípios da correcção, da boa-fé e da sensatez intelectual (algo em que eu, pessoalmente, não acredito).



PS: E se a agressão tiver sido em legítima defesa? Quem paga? O autor moral e agredido ou o autor material e agressor?

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