22 de dezembro de 2009

Sondagens: do mal, o menos...


Fonte: CESOP Infografia JN


Fui confrontado há um par de dias por um amigo acerca da utilidade das sondagens de opinião em período eleitoral. Para além de serem uma ferramenta para os partidos e um ganha-pão para empresas e universidades que as realizam, as sondagens também são muito úteis para a comunicação social. Porquê? Porque vendem. E se vendem é porque alguém as «compra». Mas, por que raio é que as consumimos?


A pertinência da questão referia-se à utilidade das sondagens para o eleitor, tendo o meu interlocutor admitida como certa uma influência negativa da publicação destas sondagens.

Por defeito de formação académica nunca me tinha questionado verdadeiramente sobre a utilidade de um tão poderoso instrumento de diagnóstico e avaliação. Talvez por isso, hesitei entre os direitos constitucionalmente garantidos – liberdade de expressão, liberdade de imprensa –, a mobilização de eleitores indecisos e a mobilização de simpatizantes ou militantes circunstancialmente abstencionistas e, finalmente, a simples curiosidade em acompanhar e analisar as tendências de voto.

Os meus argumentos não foram suficientemente sedutores como para convencer o meu amigo. E, sendo um assunto que me interessa, assumi internamente o compromisso de pensar melhor sobre o assunto.

Ora bem, asseguradas condições de durabilidade mediática curta, rigor metodológico e transparência, as sondagens de opinião pré-eleitorais têm claras vantagens mas também têm desvantagens que, na minha opinião, dependem muito da perspectiva com que são olhadas. Mas são úteis para o eleitor comum.

Por exemplo, o argumento de poderem modificar o sentido de voto é ambivalente. Tanto pode acontecer num determinado sentido ou noutro determinado sentido. Albarda-se o burro à vontade do dono… Por que razão são susceptíveis de modificar o sentido de voto? Porque, como sugere Pertti Suhonen, as sondagens são como um espelho que os media põem em frente ao eleitorado. Ao se compararem com aquele retrato, os eleitores constroem a sua própria identidade política. Pelo menos naquele momento. Em contrapartida, Seymour Sudman, estudou o efeito das sondagens de opinião nos EUA (país onde não há regulação como em Portugal e onde o mercado mediático é extraordinariamente agressivo) e concluiu que as sondagens pré-eleitorais não têm nenhum efeito no comportamento político dos eleitores. Portanto, longe de ser dado como certo, este argumento ainda tem muito caminho para percorrer.

Podemos concluir semelhante ambivalência em tantos outros argumentos. Perante um determinado anúncio, as sondagens tanto podem mobilizar eleitores como os podem desmobilizar. No primeiro caso, quando o partido com que se identificam está em dificuldades e, no segundo caso, quando o partido com que se identificam tem uma vantagem confortável. As combinações possíveis podem ser imensas.

Um dos argumentos que sustentam o carácter pernicioso das sondagens é o efeito de mimese social, no qual é gerada uma colagem do eleitor ao partido vencedor, tão descrita na literatura da especialidade. Porém, não é licito admitir que também podem gerar um sentimento de repulsa relativamente ao partido vitorioso? – aqueles gajos estão à frente? Já não vou de fim-de-semana para a neve! Dir-me-ão que o primeiro caso é muito mais grave porque envolve maiorias significativas. Mas, contraponho, não serão essas maiorias, afinal, maiorias sociais determinadas por processos sociais por vezes incompreendidos por agentes políticos? Não é essa uma das dinâmicas sociais por excelência? A que agrega um conjunto de indivíduos com determinadas características culturais comuns, através de processos de cooperação, acomodação, competição, assimilação, oposição e conflito (espero sinceramente que nesta parte o padre Augusto Silva se orgulhe de mim). E não são esses processos que ajudam a formar as identidades culturais e políticas de cada um?

En passant, as sondagens pré-eleitorais também podem conduzir ao agendamento de assuntos no debate eleitoral, até aí, postos a marinar. Mas também pode suceder o oposto. As sondagens pré-eleitorais permitem também ao eleitor acompanhar a evolução dos apoios dados a candidatos, possibilitando aos eleitores com menor sentimento de competência subjectiva uma maior segurança na decisão de optar.

Como se vê, a rocha onde nos sentamos gera perspectivas díspares. Contudo, do que não nos podemos esquecer é que as sondagens de opinião são uma ferramenta de informação e investigação científica e não de previsão de resultados, como acontece com as tradicionais «projecções eleitorais». Podem ter muita utilidade para partidos e para investigadores. Mas também para o eleitorado porque, não obstante, vinculam os políticos a compromissos perante a opinião pública como não o fazem os programas eleitorais que, em todo o caso, são insubstituíveis. Bem como torneáveis…

Mas, acima de tudo, a publicação das sondagens cumpre o desígnio da liberdade de informação a que os eleitores têm direito. Naturalmente que há riscos sempre que forem objecto de manipulações. Mas essa é uma responsabilidade de regulação que cabe ao Estado.

Num relatório internacional em 2003, dos 56 países analisados, apenas 9 aumentaram as restrições às sondagens pré-eleitorais. 15 (entre os quais Portugal), viram as restrições diminuídas e 27 não têm quaisquer restrições formais à publicação de sondagens pré-eleitorais. Neste grupo, encontramos democracias consolidadas [e exemplares] como a Suécia, Finlândia, Japão e Alemanha. E encontramos também democracias em fase de consolidação como as Filipinas, Brasil, Malásia e Ucrânia. Cada cabeça, sua sentença. Mas em todos esses países há sondagens. Eu curto à brava, admito.

Finalmente, se os eleitores são actores racionais que fazem as suas escolhas considerando os programas eleitorais, a coerência ideológica, a avaliação da performance política e outras variáveis, não serão certamente as sondagens pré-eleitorais que vão influenciar negativamente as suas atitudes e comportamentos políticos. Antes pelo contrário, podem ajudar, sobretudo o eleitorado volátil, a tomar decisões de última hora e a dar «utilidade» (para recorrer à expressão inicial) ao seu voto. Mas não é o voto útil, também, um instrumento válido? Não é com ele que se têm garantido maiorias de esquerda ou de direita no parlamento? E em outros órgãos? Do mal, o menos…


5 comentários:

Anónimo disse...

A generalidade da comunicação social é uma aut~entica lavagem cerebral á população.
Desinveste-se na educação e cultura para que sejamos seres não questionantes; apostaa-se nas condições precárias de trabalho para destruir os jovens pensantes e aniquilá-los.
Enfim tudo feito para que nos tornemos amorfos, dóceis, carneiros. E ai daquele ou daquela que saia da forma. será ostracizado, assobiado pelos pares que herdaram aquela tão viscosa e bafienta caracteristica de "bufo" da época salazarista.
Observando bem é para aqui que caminhamos, podres sobreviventes num mundo esquecido de valores, andando em negociatas, corrupção, selvajaria e invejas a crescer desmesuradamente.

As sondagens fazem parte da ponta do iceberg

óscar m torres disse...

«carneiros» sempre fomos... as sondagens, «a ponta do iceberg»? qual iceberg? se há forma de as pessoas não se manterem na ignorância é acederem a informação e hoje com a globalização é difícil esconder as coisas que antes se escondiam da populaça.

ARV disse...

Concordo em parte com o Anónimo das 21:26 quando diz que a comunicação social é uma autêntica lavagem cerebral. E concordo em parte porque há várias tendências de lavagem cerebral. O Le Monde Diplomatique faz uma lavagem diferente da lavagem do Herald Tribune, por exemplo. Em Portugal acontece o mesmo. E as pessoas podem escolher. Eu escolho quais os órgãos de comunicação social que quero para higienizarem o meu cérebro. Assim como os livros que quero. Portanto, faço uma escolha e submeto-me a uma determinada lavagem quando leio um manifesto político, um ensaio ou seja o que for. Desligo a televisão quando não me interessa e, hoje, até tenho centenas de canais à disposição, se tiver pachorra para isso.
Quanto ao resto, não vejo como as pessoas de hoje se tornam mais «carneiras» que outrora. O comentário do Anónimo das 21:26 é um exemplo de não acomodação. Espero que não seja o único.

E as sondagens, afinal o tema do post?

AF Sturt Silva disse...

Qual é o partido ou coligação de extrema esquerda em Portugal?Qual está mais forte e está comprometida com o marxismo(revolução)?
Be ou cdu,ou outra?

Anónimo disse...

AF STURT,

Nenhum! Sabem lá eles o que é o marxismo...