17 de maio de 2010

Bruna Real, a professora «imoral» ii


foto: Joana Freitas para a revista Playboy

A polémica estalou e a rapariga foi parar ao arquivo da autarquia. Como é evidente, ao posar para a Playboy, a professora Bruna Real não violou a legalidade nem a própria deontologia profissional, na medida em que o fez fora do horário de trabalho. E fora até, do ano lectivo (em Agosto, ao que parece). Portanto, a questão coloca-se no plano do «alarme social», de acordo com a sentença prévia da vereadora da autarquia de Mirandela. Mas podemos reflectir sobre o «alarme social» que, evidentemente, está associado ao corpo enquanto objecto de desejo e a um interdito moral que é expresso pela incompatibilidade entre a dignidade de ser docente e a indignidade da nudez (a que a Idade Média fez o especial favor de endemoninhar).

Em primeiro lugar, a ideia de pecado que agrilhoa um corpo desnudado e o prazer sugerido pelo erotismo das fotos. Em algumas religiões, há uma má relação com o corpo: deriva num tabu porque é reduzido à sexualidade, ao fruto proibido, ao pecado. Mostrá-lo descomplexadamente não deveria suscitar reacções de pudor. Afinal, é carne embrulhada em pele. Nem deveria indexar a decisão de o mostrar a um comportamento desviado. Mas é nesse ponto que está a professora Bruna Real, como se o facto de posar nua para a Playboy precipitasse as crianças para um destino «também ele» irremediavelmente desviado. É certo que um docente pode funcionar como um modelo de comportamento, sobretudo quando apresenta virtudes convencionadas pela sociedade. Mas, fundamentalmente, nas idades indefesas dos alunos desta professora, quem funciona de forma determinante como modelos de comportamento são os pais, os [ainda] heróis. E, se há uns que são heróis, outros há que são vilãos. À séria…

Será razoável admitir que, depois destas fotos, as criancinhas queiram todas despir-se e pôr mamas de silicone? Não, se as coisas forem devidamente arrumadas nas categorias correspondentes e se o corpo for desmistificado. Ou também vamos começar a afastar os professores cuja conduta quotidiana seja moralmente suspeita? Se formos por aí, não restarão muitos porque certamente encontraremos casos de adultério, consumo de drogas leves (incluindo tabaco e álcool) e tantos outros comportamentos lesivos da moral e dos bons costumes.

foto: colecção G. Armani
A figura de Cristiano Ronaldo é um bom exemplo. Muito mais do que a professora, o futebolista é uma referência para muitos milhões de crianças em todo o mundo. Ostenta um mundo de fantasia para a esmagadora maioria das pessoas e permite-se fazer fotografias inegavelmente eróticas como esta. Não será razoável explicar às crianças que Ronaldo tem a profissão de jogador de futebol mas também é modelo fotográfico? Ao sê-lo, já deixa de comercializar uma representação do seu corpo e demarca-se de uma «reles rameira» que, em rigor, não é o seu corpo que comercializa? Por que não se explica que a senhora é na escola uma professora e fora dela uma modelo fotográfica, como podia ter sido a Naomi Campbell se tivesse aptidões pedagógicas? O problema está na exposição das partes íntimas? Mamas e o insinuante recorte dos grandes lábios? E a posição sôfrega da modelo da Triumph, como que a convidar submissamente às investidas vigorosamente «traiçoeiras»? Na minha opinião, esta fotografia dialoga de forma muito mais directa, apesar de não mostrar as partes. Alguém negaria um contrato à actriz Cláudia Vieira, também ela modelo da Triumph?


foto: colecção Triumph
Talvez seja um problema de inversão dos papéis sociais: Bruna Real é uma professora para os alunos, pais e autarquia; o papel de modelo vem subverter a representação original que construíram da profissional. Para a família e amigos é, antes de mais, uma amiga, uma filha, uma rapariga igual a tantas outras e com fetiches eventualmente menos nocivos do que muitos que andam escondidos atrás de gravatas e de decotes conservadores.

Talvez seja um problema de campo, isto é, se passeassem em praias de nudistas com os pais e lá encontrassem a professora em pelota, certamente lhes tapariam os olhos mas… nada a fazer, ela já lá estava antes, num local apropriado. Ora, é exactamente essa delimitação que importa também explorar. Se não me engano, a Playboy é vendida a maiores de 18 anos e a rapariga já lá estava. Isso significa que os curiosos foram deliberadamente à procura dela praia nudista das revistas…

Apesar de estarmos a falar de regiões rurais, do interior e bastante organizadas em torno de um conjunto de padrões atitudinais e comportamentais amplamente encorajados, rejeito o argumento do «meio pequeno». Esta é uma questão de fundo e que diz respeito à dignidade do corpo e à emancipação da razão. Quem alimentou o «alarme social» foi a senhora vereadora e as mulheres que, em quantidade desproporcionada, esgotaram a Playboy das bancas em Mirandela. Este episódio fez-me lembrar o filme Malèna, de Fellini, com Mónica Bellucci. Vale a pena ver porquê…

As crianças, dizem os especialistas, têm uma grande capacidade de encaixe. Apetece dizer que, em muitos casos, têm uma capacidade muito maior dos que os adultos.


2 comentários:

Anónimo disse...

se as professoras de matemática fossem assim, nem precisavam de saber a matéria. apenas precisariam quem alguém corrigisse os exames: os rapazes iriam querer fazer boa figura para agradar à «simpática» professora. E as raparigas iriam fazer boa figura para inviabilizar as aspirações dos rapazes.

e na festa n.º 100, a professora mostrava as mamas

Anónimo disse...

A grande maioria dos portugueses são hipócritas. Moral e bons costumes é a palvara de ordem nas conversas de café, mas nas vidas privadas é tudo ao contrário. Falam da vida dos outros, sempre a apontar o dedo e a criticar as escolhas, as atitudes, a forma de estar dos outros mas desejando ser como as pessoas que criticam.

Vivendo numa sociedade assim, não supreende que tudo se escandaliza com a nudez. E tanto homens como mulheres são criticos mordazes, a única diferença é que as mulheres dão a cara, os homens criticam pela calada