11 de fevereiro de 2011

A América de Tocqueville (1)

Aclamada como uma das obras clássicas de referência da ciência política, Da Democracia na América é o resultado apaixonante de uma reflexão epistemológica desenvolvida a partir da pesquisa empírica no terreno e da comparação dos sistemas políticos de duas nações saídas de revoluções marcadamente liberais, ainda que com enquadramentos distintos: a Revolução Americana no Novo Mundo (1776) e a Revolução Francesa no Velho Mundo (1789). Não deixa de ser curiosa esta precedência cronológica da Revolução Americana e as eventuais especulações relacionadas com a função de modelo que poderia ter desempenhado para os arqui-inimigos dos britânicos.

Em todo o caso, a observação que o aristocrata francês Alexis de Tocqueville faz do sistema político americano é particularmente notável pela exaustividade com que descreve a sua organização institucional e pela inteligência com que aborda assuntos que ainda hoje permanecem no centro da discussão sociológica e politóloga contemporânea. Não obstante tê-lo feito a coberto de uma incursão motivada pelo estudo do sistema judicial americano durante nove curtos meses.

Neste trabalho são debatidas algumas questões que a obra levanta, nomeadamente a tensão entre igualdade e liberdade que Tocqueville considera existir em sociedades democráticas e que é fundamental mitigar. A necessidade de aplacar os efeitos que a igualdade em excesso pode desencadear dá origem a uma proposição teórica de grande interesse para a reflexão crítica contemporânea acerca das democracias: a tirania da maioria. Os sistemas de representação proporcional são um reflexo dessa preocupação, bem como todas as engenharias eleitorais, administrativas e de participação política que algumas democracias implementam, sobretudo quando inúmeros particularismos culturais, geográficos e estratégicos exigem um tratamento específico. Mais, por meio dessa proposição teórica, o autor adverte para os próprios riscos e contradições da democracia. E serve-se do exemplo americano para dar pistas, sugerir caminhos.

Finalmente, ao longo deste texto são também levantadas dúvidas sobre a forma como o autor apresenta algumas ideias mas, apesar do seu compreensível desconhecimento de alguns preceitos metodológicos da sociologia, Tocqueville prestou-lhe com esta obra uma contribuição inestimável.

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