8 de abril de 2011

O FMI está aí, mas como o sol, não é igual para todos


Em quatro décadas (em 32 anos, para ser mais preciso), esta é a terceira vez que Portugal recorre à «ajuda» do Fundo Monetário Internacional. No mínimo, é impressionante, para não dizer confrangedor. Por demais debatido, pouco adianta agora avaliar as habituais consequências - invariavelmente nefastas - que tal intervenção terá na economia portuguesa (como teve no passado e como tem no presente na Grécia e Irlanda). Mas numa coisa é difícil discordar do primeiro-ministro: é um «desprestígio» para a imagem do país... Particularmente numa altura em que a imagem é aparentemente tão sobrevalorizada. Desnecessária ironia. Mas o Partido Socialista, a partir de hoje em congresso, tem que lhe explicar que a imagem não é tudo (mesmo para os países de «tanga») e essa ideia do status estar indexado exclusivamente à imagem é coisa do passado. Por um lado, não foi a imagem de «um país moderno e sofisticado» que conduziu a esta escalada nos juros da dívida pública mas sim o conhecimento dos credores sobre os problemas estruturais do país, tantas vezes diagnosticados e tantas vezes varridos para debaixo do tapete pelos governantes. Por outro lado, não é na imagem dos portugueses que vai doer especialmente mas sim nos seus estômagos.

Em quase quatro décadas, Portugal tem sido invariavelmente governado pelo chamado «arco do poder», constituído por PS, PSD e CDS-PP. Houve conquistas e avanços, é certo. E muito desperdício, próprio do novo-riquismo de um país acabado de sair de um longo mergulho de 48 anos. Todavia, nenhum se incomodou com a solução efectiva para os problemas estruturais e, quando o procuraram fazer, ou foi ao arrepio de decisões sérias ou foi a coberto de efémeros interesses económico-partidários. Esta situação configurou bolsas de autêntico retrocesso. A começar pela vergonha dos mais baixos níveis de escolarização da OCDE, recente e timidamente mascarados pela ainda maior vergonha em que se tornou o programa das Novas Oportunidades, as quais mereceram um particular empenho do primeiro-ministro. Acabando no enterro da produção agro-industrial e no eterno problema da competitividade da economia portuguesa, assente na precariedade, desqualificação e baixos salários. Além disso, em quatro décadas, o esteio e reconhecimento que deveriam merecer os políticos e os partidos políticos deteriorou-se inapelavelmente na sequência de casos e casos e casos de absoluta irresponsabilidade política, despesismo, corrupção, clientelismo e singular miopia. Saldanha Sanches não se cansou de acusar as metástases do Estado, não obstante ter merecido da parte dos portugueses pouco mais do que desprezo.

A vinda do FMI estava anunciada, era desejada.
1) Desejada fortemente pelos bancos portugueses que, do alto do pedestal, não se coibiram de fazer ultimatos ao Estado, mesmo sabendo que dele comeram a carne e os ossos com alto sentido de patriotismo. Mesmo sabendo que uma fatia de campeão da responsabilidade moral pelo sobreendividamento das famílias lhes cabe integralmente. Imorais para exigir seja o que for daqueles que não podem continuar a cumprir as suas obrigações;
2) Desejada fortemente pelo governo, incapaz de resolver os problemas do país, incapaz de conservar uma preciosa maioria absoluta no Parlamento, incapaz de construir uma imagem suficientemente atractiva para os credores como para lhes saciar o monstruoso apetite, incapaz de reconhecer as suas próprias fragilidades; 
3) Desejada fortemente pelo PSD que, na ganância do poder, predispôs-se a chumbar irresponsavelmente o PEC IV mesmo sabendo que não havia alternativa naquele preciso espaço-tempo. É sobejamente mais confortável instrumentalizar a vinda do FMI como meio de cobertura política para, enquanto governo, implementar as medidas difíceis que, de outra forma, não teria tomates para executar.

Não vale a pena perder muito mais tempo com a conversa das responsabilidades dos partidos políticos. Todos têm as suas relativas e proporcionais responsabilidades, na medida em que fazem parte do sistema e têm eleitos em órgãos executivos e deliberativos, seja a nível nacional, regional ou local. Todos contribuem para a despesa, seja ela mais ou menos racional. Todos têm a sua quota-parte, apesar da flexibilidade de alguns em conviver com situações internas de grande controvérsia. Em alguns casos, em clara demonstração de impunidade; imunes à justiça dos comuns, à justiça capturada e colonizada pelos poderes político e económico. Esses quantos não têm medo de perder empregos, de perder salários, de se alimentar gulosamente do erário público. E continuarão assim porque têm a consciência que aí não mexe o FMI nem a carneirada que lhes enche a pança, nalguns casos à custa da sua própria. Contudo, é fundamental que neste jogo de responsabilidades, a culpa não morra solteira nem se case com todos: há responsabilidades criminais que vão além da fugidia responsabilidade política!

PCP e BE deram um interessante sinal de convergência na reunião de hoje. Por seu turno, os socialistas têm, a partir de hoje, uma excelente oportunidade de aprender outra valiosa lição e retornar aos valores e aos princípios do socialismo.
Mas todos sem excepção devem reflectir sobre a necessidade de moralizar a vida política, sobre a responsabilidade exemplar que têm perante os representados e perceber que há limites cujo desrespeito não pode ser de modo nenhum tolerado pelos cidadãos. É assim que deve ser, em democracia.


2 comentários:

Anónimo disse...

E o que dizes do vendido do fernando nobre?

ARV disse...

vendido