21 de março de 2012

Este país não é para jovens


A recente profusão de programas televisivos e radiofónicos dedicados à diáspora de portugueses espalhados por esse mundo fora com mais ou menos sucesso, atirados pelas circunstâncias da vida à expansão ultramarina pela realização profissional e pessoal ou pela mais prosaica sobrevivência, não pode deixar de se ligar aos apelos do governo à «internacionalização» de jovens qualificados cujas formações foram pagas pelas famílias e pelo próprio Estado. Mais um bom investimento para os países de destino, outra jogada rumo à mediocridade protagonizada pelo nosso governo democraticamente eleito.

Em primeiro lugar, estes apelos representam a oferta generosa do Estado português a outros estados que, dessa forma, recebem profissionais qualificados e, nalguns casos, treinados para a excelência. Em segundo lugar, representam a desistência ao mais alto nível de activos absolutamente necessários à reconstrução de um país, movida pela expressiva incapacidade dos governantes em contrariar o venenoso desemprego jovem e os labirintos de vida em que os jovens portugueses se encontram, para invocar a brilhante investigação de José Machado Pais em “Ganchos, Tachos e Biscates”. 

Tornamos, pelas piores razões, à Nau de Ícaro ensaiada por Eduardo Lourenço, projectando coercivamente a lusofonia para lá do recatado jardim, desta vez, para os não-lugares da sua matriz. Condenamos os jovens à diáspora, não por uma aventureira idiossincrasia mas sim pelos mesmos motivos que justificaram a emigração massiva de irlandeses para a América em meados do século XIX: a fome. Contudo, no nosso caso, fazendo questão de exilar alguns dos melhores, tal e qual como fizemos com a perseguição de judeus/cristãos novos que, enfim, um Pombal haveria de desacertadamente «remediar» com a expulsão dos jesuítas (não houve, nesta expulsão, qualquer retaliação pelos actos hediondos da Companhia de Jesus mas um reles e mesquinho sentimento anti-jesuítico). Os exemplos históricos da inversão de prioridades e desalento intelectual são numerosos, sendo talvez o mais recente a troca do sector produtivo pelos subsídios à improdutividade: o negócio de Fausto com o Belzebu. Esta atracção pela autodestruição já era notada por Mouzinho da Silveira quando acusou os três séculos de parasitagem de escravos e a consequente necessidade de “criar uma nova existência, criando os valores pelo trabalho próprio”. Mas como?...

Não há, hoje muito mais, elites políticas à altura. À altura, por exemplo, da capacidade demonstrada pelo país, com mais ou menos tensões e dissabores domésticos, nos momentos em que o seu mercado de trabalho absorveu meio milhão dos designados «retornados». Com custos, é certo, mas entendeu-os como portugueses, proprietários de um referencial cultural colectivo que nos caracteriza a todos. Logo, como nós próprios. Desse momento saiu o país fortalecido. Mas depressa o esqueceu. Em contrapartida, estes novos políticos caracterizam-se por virar a cara à luta, pela exibição da sobranceria acoplada a um estatuto conquistado por outros, por menosprezar a construção democrática e por atirar provincianamente a toalha ao chão perante o chamamento dos sofisticados países que lhes servem de modelos. Durão Barroso é talvez o exemplo acabado deste perfil, mesmo sabendo da disposição de Passos Coelho olvidar a sua própria matriz ideológica – a liberal – em matérias tão fulcrais como o crescimento económico. Já noutras – saúde, educação – comporta-se como o mais tenaz neo-liberal num cenário em que as assimetrias socioeconómicas são sulcadas a uma velocidade vigorosa.

Resta saber, porque importa, se os canais de rádio e televisão que descrevem os exemplos de boas práticas de jovens qualificados e bem-sucedidos no mundo, trabalham a soldo de uma inequívoca política de esvaziamento jovem do país (a par da 3ª mais baixa taxa de natalidade do mundo) ou se, candidamente, apenas querem mostrar aos políticos tudo aquilo que os nossos jovens poderiam fazer em Portugal se não tivessem sido irresponsavelmente exortados a sair sem sequer terem direito à mais elementar escolha.

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